Para Tati Bezerra e Daniele Costa: tão fatais em seus cheques-mate.
- Não eu não vou condicionar a minha escrita! Não vou. Eu poderia arrebentar com essas correntes do pudor, da moral da puta que pariu. Sim eu poderia, é eu poderia. Eu a via "ascendendo" um cigarro no outro, frenética. Cada vez que abria a boca cuspia palavras que se debatiam no chão numa convulsão grave, gravíssima. Não me assustava porque sabia o exato momento no qual ela tinha de soltar esses bichos grandes mutantes. Era fase de semi-revolta ou revolta embutida nunca sei.
– Mas eu não entendo por que, não entendo por que essa vida em dois corpos. É como se a minha alma apaixonada pelo completo, pelo intelectual egocêntrico, pela cultura que não é pra todo mundo não, tivesse vontade de habitar um outro corpo e habita. Como se quisesse freqüentar teatros, cinemas, shows de rock, baladinhas de absinto, mandrax, sarais de gente underground, conhecer gente vazia que se acha, gente com conteúdo escondido, gente de conteúdo que se acha, gente que se acha vazia, gente estranha, gente sozinha, buscando, buscando, buscando... Controlava-se ao máximo para não parecer louca e neste momento se sentia falsa em ser a mesma e várias e não mostrar a outra alma tão forte que habitava em si onde justamente os seus eus se dividiam e que agora vomitavam por não ter espaço. Mostrava-se para mim porque as nossas coisas sempre foram muito mais além do horizonte da Terra e quanto mais abismos melhor. Gostava dos abismos com ela, dos abismos dela. Gostava. Eram espelhos para mim e eu via junto com ela infinitos caminhos, infinitos mesmos caminhos que já não sabia se era dela para mim ou ao contrário, ou do avesso.
- Sabe meu Rei, esse segundo balde de café é para o meu outro corpo não é para mim. Quem dera fosse assim: Hei - Leis Universais - preciso de um outro corpo nessa vida porque a minha alma se prolifera. Tudo agora precisa ser dobrado porque tenho duas almas, não vê? Uma normal outra que levita e elas não se dão bem no mesmo espaço. Elas se detestam se cospem se agridem se desprezam e eu me pergunto onde, onde meu Rei, eu entro nessa história. Eu tenho mais é que separá-las senão dá briga, senão dá morte e se eu morrer metade nunca terei a chance de ao menos tentar ser completa. E tá tão difícil o ser e o estar com estas duas se batendo se mordendo se matando.
– É amor retraído – disse eu rindo da cara dela de quem caiu do caminhão da mudança, bateu a cabeça no meio fio e agora vaga sem identidade – Na verdade, elas estão loucas para se chupar. Caiu em uma risada insana e muda.
Era branquinha e fina e tremia. De gastrite, de nicotina. Eu ria por dentro, sorria por fora. Era louca assim que eu gostava porque assim crescia. Era essa falante desvairada que adorava: era o olhar de absorção que ela gostava.
E ainda rindo com as mãos nas lágrimas – É parece arena medieval, dois cavaleiros em combate; parece arena medieval e o imperador com o dedão oras para cima oras para baixo definindo morte e vida num gesto sou eu. Mas são almas e almas voltam e disputam o espaço no corpo de outros cavaleiros ou gladiadores em outras situações, em situações avessas sei lá. Em situações onde uma se destaca mais que a outra e tal. Parece jogo de xadrez onde as duas almas não saem do “cheque”. E eu não quero o “cheque-mate”. Não escolho hoje uma a outra. Não posso. Já cheguei até aqui e não posso pedir pra sair da arena senão a população de Roma me mata a pau a pedrada.
Curta o jogo – eu disse. Por mais embaraçoso. Curta o jogo. Saberá equilibrar bem Pequena. Ela balançava a cabeça num leve desespero. Ela balançava a cabeça num capricho infantil. - Eu queria ser o jogo – não disse. Queria ser o jogo principal do teu conflito de almas – não falei.
- Mas você sabe – ela disse – você sabe meu Rei que não vivo sem esses conflitos subjetivos – riu imóvel. Ficamos fixos. Imóveis na mesinha da cozinha pequena.
As coisas depois de muito atrito, depois de muita especulação caem num silêncio que reverbera, que se prolonga... Era o quinto sexto cigarro. Era o terceiro quarto balde de café...
– Mas eu não entendo por que, não entendo por que essa vida em dois corpos. É como se a minha alma apaixonada pelo completo, pelo intelectual egocêntrico, pela cultura que não é pra todo mundo não, tivesse vontade de habitar um outro corpo e habita. Como se quisesse freqüentar teatros, cinemas, shows de rock, baladinhas de absinto, mandrax, sarais de gente underground, conhecer gente vazia que se acha, gente com conteúdo escondido, gente de conteúdo que se acha, gente que se acha vazia, gente estranha, gente sozinha, buscando, buscando, buscando... Controlava-se ao máximo para não parecer louca e neste momento se sentia falsa em ser a mesma e várias e não mostrar a outra alma tão forte que habitava em si onde justamente os seus eus se dividiam e que agora vomitavam por não ter espaço. Mostrava-se para mim porque as nossas coisas sempre foram muito mais além do horizonte da Terra e quanto mais abismos melhor. Gostava dos abismos com ela, dos abismos dela. Gostava. Eram espelhos para mim e eu via junto com ela infinitos caminhos, infinitos mesmos caminhos que já não sabia se era dela para mim ou ao contrário, ou do avesso.
- Sabe meu Rei, esse segundo balde de café é para o meu outro corpo não é para mim. Quem dera fosse assim: Hei - Leis Universais - preciso de um outro corpo nessa vida porque a minha alma se prolifera. Tudo agora precisa ser dobrado porque tenho duas almas, não vê? Uma normal outra que levita e elas não se dão bem no mesmo espaço. Elas se detestam se cospem se agridem se desprezam e eu me pergunto onde, onde meu Rei, eu entro nessa história. Eu tenho mais é que separá-las senão dá briga, senão dá morte e se eu morrer metade nunca terei a chance de ao menos tentar ser completa. E tá tão difícil o ser e o estar com estas duas se batendo se mordendo se matando.
– É amor retraído – disse eu rindo da cara dela de quem caiu do caminhão da mudança, bateu a cabeça no meio fio e agora vaga sem identidade – Na verdade, elas estão loucas para se chupar. Caiu em uma risada insana e muda.
Era branquinha e fina e tremia. De gastrite, de nicotina. Eu ria por dentro, sorria por fora. Era louca assim que eu gostava porque assim crescia. Era essa falante desvairada que adorava: era o olhar de absorção que ela gostava.
E ainda rindo com as mãos nas lágrimas – É parece arena medieval, dois cavaleiros em combate; parece arena medieval e o imperador com o dedão oras para cima oras para baixo definindo morte e vida num gesto sou eu. Mas são almas e almas voltam e disputam o espaço no corpo de outros cavaleiros ou gladiadores em outras situações, em situações avessas sei lá. Em situações onde uma se destaca mais que a outra e tal. Parece jogo de xadrez onde as duas almas não saem do “cheque”. E eu não quero o “cheque-mate”. Não escolho hoje uma a outra. Não posso. Já cheguei até aqui e não posso pedir pra sair da arena senão a população de Roma me mata a pau a pedrada.
Curta o jogo – eu disse. Por mais embaraçoso. Curta o jogo. Saberá equilibrar bem Pequena. Ela balançava a cabeça num leve desespero. Ela balançava a cabeça num capricho infantil. - Eu queria ser o jogo – não disse. Queria ser o jogo principal do teu conflito de almas – não falei.
- Mas você sabe – ela disse – você sabe meu Rei que não vivo sem esses conflitos subjetivos – riu imóvel. Ficamos fixos. Imóveis na mesinha da cozinha pequena.
As coisas depois de muito atrito, depois de muita especulação caem num silêncio que reverbera, que se prolonga... Era o quinto sexto cigarro. Era o terceiro quarto balde de café...
Este texto foi publicado no antigo endereço piasuja.zip.net que fora excluído.