segunda-feira, outubro 06, 2008

A caminho da Estação do Etéreo

“Coração, coragem, pra qualquer viagem, pra qualquer sermão”.
Marina Lima

Existe um certo veneno no sono, mata dormindo, quando um dos meus eus, preocupado comigo, levanta de mim, joga num conta-gotas gotas de antídoto no meu peito produzido em um sonho qualquer de uma outra que não sou eu, que pede para me predominar, gota a gota, como venho construindo esse teto seguro em cinco dias de quinze horas de pequenas mortes, um velório sem fim sobre o colchão, a cabeça no travesseiro, a alma passeando em paises estrangeiros a mim, a gota cai fazendo buracos negros de verdades em que despenco como uma cadente indo pra onde eu não sei depois do pedido, num desespero doce de encontrar soluções súbitas, tão exatas, como mágica, colorir de uma vez com um dedo só, todo o alfabeto da cartilha da série dos vintes e muitos anos que tenho e com as operações básicas aprendidas, multiplico os anos por dez, duzentos anos de solidão é o resultado da conta de tantas construções e desmoronamentos, demolições, ricos empreendimentos, prédios de luxo, cinqüenta andares de prazer e cinqüenta dinamites escondidas atrás dos extintores personificados em fiscais de obra quando algo sai errado, extinguem o comportamento, chamam a vigilância e destroem num sofro o edifício que se fazia tão perfeito, é difícil recomeçar, ecoava nos desfiladeiros do sonhos, na “Bouvelad of broken dreams”, vago só a alma sem alma, itinerante racional na freqüência do passado emocional tão carregado de mágoas, culpas, amores retraídos, desejos de se libertar de tudo isso, das lembranças da proa de um navio já naufragado, sentada na rampa de um prédio abandonado, pego o ultimo cigarro, troco por vodca com a menina sentada atrás de mim, flerto, mas de boa, sem grande empolgação porque conheço os ciclos sem fim e já hoje não há ciclo que me engane, exceto os novos que tenho evitado entrar para não se coincidirem com os velhos, me pergunto do sentido, que sentido? O sentido que vaga numa bruma rala, aguada, áspera, diz que é parte do jogo não ver além de dois passos adiante forçando corajosamente a olhar apenas o chão pisado no momento do pé direito, pé esquerdo, sem filosofias mirabolantes, profecias, a névoa pede para não olhar para trás, perco a chave da moto, sigo como quem anda com um grande segredo, uma grande verdade que escorrega todos os dias no canto da minha boca, limpo o excesso de saliva, não digo, ando dormindo pra tomar um café a sós comigo, se eu mesmo mal consigo explicar, só sentir, e ver o meu andar do presente, mesmo o meu pé sendo oras passado, oras futuro nos passos que só se tornam presente de fato quando os pés estão juntos, ou deitados, a loira me abraça por trás, oi morena! dou um sorriso, flerte, mas de boa, pego a chave da moto que ela achou, acordo, relembro do meu espírito vagabundo na rampa do prédio abandonado onde as pessoas se encontram pra beber, fumar, vandalizar, viajo de novo, mais quinze horas, água no criado mudo para regar o velório, as sucessivas mortes em função de uma grave infecção mental, aquela que afeta o lobo parietal por querer perder a memória, e levando a vida quase morto, vivendo nos sonhos o real do inconsciente, acordo de novo como quem volta de um coração quase parado, à eletro choque.

Um comentário:

Anônimo disse...

E sobre a mesa descansam os talheres sujos e os copos ainda com um pouco de vinho. Os olhares se entrelaçaram e as almas perderam as estribeiras. As bocas salivaram como lobos sobre as rochas do deserto. Os olhos escureceram e os seios entumesceram. Tudo se perdeu naquela vaga, onde vago entre as pragas da sua memória, da sua mente demente. Tudo se fez sangue e se fez duro e tudo se eprdeu no acaso. Mas apenas quando terminou aquele gozo de dor e ilusão.