quinta-feira, dezembro 17, 2009

Para Caio, Para Fernando

Deixe-me morrer com as tuas cinzas

Naufragada no teu cinzeiro da sala.

Após a minha morte eu saberei que fui tua

Pois terei percorrido o teu peito inteiro

Impregnado as tuas narinas com o meu cheiro

E amargado a tua boca com o veneno da minha loucura

Gratuita, derretida e morta após a fissura.

quarta-feira, dezembro 02, 2009

O Diário e as cenas de Violeta Segóvia - Ep. 04

A putaria nunca fez a minha cabeça, me faltam experiências, mas quando se está bêbada nossos anos ficam abertos às oportunidades empíricas. A festinha de final de ano da empresa me fez lembrar dos meus e reavaliar a vidinha sem graça que ando tocando. Mapas, cartas, sorte, nenhuma vinga, chances não rolam. Engordei dez quilos nessa brincadeira. A Renata troca de namorada a cada 3 meses. Um trimestre com loira, outro com morena, outro com ruiva, até moradia pra puta rolou esse ano. Ao menos não paguei nem a metade do aluguel em troca de Victoria’s Secrets de morango para amaciar a pele muito tocada da figura trimestral da Renata. O Mário, o publicitário gostoso, pagou de meu melhor amigo. Mas melhores amigos não se comem, são conselheiros amorosos onde os meus dons de pitonisa acabam por reforçar essa minha falta de sexo fixo. Baladas solitárias, cachaça nos fins de semana, perdi a conta de quantos holliwoodianos e europeus assisti no gato da tv a cabo. Do trabalho pra internet, da internet pra cama, da internet pro sofá, da internet pro chuveiro, da internet pra masturbação, da internet pra alimentar sonhos de viagens internacionais em vão, da internet pra ilusão de um romance via messenger, da internet. Parada na mesa da pizzaria, sem graça à moda da casa, sem graça à portuguesa ou à calabresa com catupiry:

- A minha amiga secreta é reservada, não sai de casa sem um lápis no olho, a sombra combinando com a blusa, cheira a pão de mel, olhos de quem sabe tudo sobre você e o seu nome é da cor dos olhos da Elisabete Taylor! Já sabem quem é a minha amiga?! – Vozerio, exclamações e adivinhações. – É você Vi-o-le-ta!

Sorrisinho. Tive que atravessar o mar de quase trinta pessoas na mesa. A estagiária “dadinha” do escritório. Dezenove anos de bosta na cabeça.

- Brigada Fabiana! Adorei a Mandala. Vou pendurar na parede com as setes que já tenho! - a ironia escorrendo pela boca.

- De nada querida! Ah, sabe, eu não sabia o que te dar. Mas como o Mário me falou que você curte essas coisas ai de bruxaria, de magia, né, eu resolvi comprar isso. Sabe, eu nunca vi uma coisa dessas. É pra chamar energia, né?

- É. E você as chamam pelo nome, sabia? A maioria é nome de mulher. Acho que devem ser todas lésbicas! - os monges tibetanos devem estar se chicoteando a esta hora, os Maias se revirando debaixo das florestas da Guatemala só de pensar num asno daquele borrado de batom passeando com uma Mandala na rua achando ser um prato onde se sacrificam porcos para beber o sangue – pensei olhando pro presente.

Como a gente nunca sabe que presente dar, ainda mais quando você tira a mais mal comida do seu ambiente profissional, quarentona, solteira há trinta e nove anos e não sabe o que é rola desde quando tomou banho com o primo aos oito anos no chuveiro da casa da avó, resolvi dar algo relativo à miséria do contexto. Incorporei a Violeta mais simpática que habita em mim:

- A minha amiga secreta é uma pessoa muito responsável, nunca se atrasa, sempre de cabelos presos e saias longas e tem horror a fofocas. Vocês sabem o nome dela? – vozerio, exclamações e adivinhações – É você An-gé-li-ca!


- Ah Violeta, só você mesma! “Da dama à profissional - como enlouquecer um homem na cama" por Rita Cadilac! Nossa, vou aproveitar bem esse livro com o, com o... – a esta altura tinha tanta gente cascando o bico que ninguém escutou o nome do dito cujo. “Deve ser o Cosme, o vibrador falante, que ela guarda a sete chaves no criado mudo, é claro” – pensei.

E assim, um a um, foi revelado o amigo secreto e o verdadeiro self dos funcionários que se escondem atrás das relações de trabalho. Sabemos que estas festinhas são reveladoras do lado mais descontraído e pervertido da corporação. E o meu não poderia estar de fora. Depois da pizzaria, esticamos num bar. As três mais recalcadas se foram, o chefe, o supervisor e a gerente também com medo de comprometimentos, é obvio. Sobraram uns dez. A cerveja foi batendo, o povo ficou mais espertinho, mais uma caipirinha, pra mim de morango por favor, pra mim pode ser de limão mesmo, mais cerveja, os mais empolgados uísque, mais batata frita, pinga de uva e o convite foi feito:

- Gente, o Adalberto foi se embarcar. Vocês sabem que ele passa mais tempo trepado naquele navio do que em mim. A casa tá liberada. E então, vambora?

Esse é um dos motivos da minha amizade com a Josimar. Pessoa cabeça aberta, pra frente, sem frescuras. Esse nome unisex, como já falei, é só um detalhe quase que insignificante.

O Mário aceitou de pronte, a recepcionista novinha com vontades à flor da pele se intimidou, mas apoiada pelos mais velhos aceitou também. A grossa e sem noção da Patrícia deu vinte desculpas só para que insistissem. Uma pessoa de ego carente precisa de confete. A Rosi, casada e cinco filhos, alegou não demorar muito, o seu Vanderlei do almoxarifado foi mais sincero, adoro uma putariazinha formal. O rapazinho do café disse que iria ficar tarde já que são três conduções e quinze minutos a pé de volta para sua casa. Mas a Josimar ofereceu a cama do Adalberto pra ele ficar. E a estagiaria nem preciso comentar.
A sensação que tive era que aquela noite não iria prestar. Depois era sábado, tempo pra ressaca ia ter, mas pra remendar a cara de qualquer segredo comprometedor revelado, ainda mais com os colegas de trabalho, poderia acabar em chantagem ou desemprego. Deixei o pessimismo da Lua em Touro de lado, paguei a conta e fomos pro carro.

To be continued...