segunda-feira, fevereiro 25, 2008

Arcano XIII

Tinha sido convocada para uma reunião sem aviso prévio em uma sala mental com os meus demônios. Principados da culpa, potestades das lamentações, demoninhos do sem sentido. Tomei a palavra e criei fugas. Escrevi. Disse que iria comprar um livro para satisfazer o demônio mais lindo da luxúria sem expectativa de leitura e conclui: demônios aconselham. Fui até a Praça dos Andradas onde ficam algumas bancas de sebo. Fui falar com Jorge. “Qualquer livro cujo título me chamasse atenção compraria” – pensei no caminho como sempre penso em dias assim. Subo os olhos nas estantes de fora da banca e meu olhar cruza com “Morangos Mofados”. Imediatamente, minha boca enche d’água: - Jorge, você sabe como é difícil encontrar um livro do Caio e há quanto tempo venho te pedindo?! Um livro desses nunca aparece por aqui, não é mesmo? Transei com o demônio do prazer e calei a boca dos demoninhos do sem sentido. Era a 9ª edição dos “Morangos” de 1995. A última edição lançada com Caio ainda vivo. Hoje se completam doze anos de sua morte. – Sincronicidade, menina! – disse Valdir, o anjo das letras a noite no Almanaque. Viajei na hipótese de Caio ter intuído meus demônios (que é mais a cara dele!) e me levado até Jorge e até ele no dia. Fiz uma festa de fato. Reguei com cerveja, pessoas queridas, antigo amor, cigarro e transa. Tudo a cara dele com aquele vazio de final sempre crucial a ser sentido pelos personagens. E até me tranquei no dia seguinte exatamente como faria um ícone desiludido tentando encontrar algum prazer na solidão. Tudo na minha “Natureza Viva”. Doze anos é tempo pra caramba e eu brindo a ti Caio em uma data tão importante de libertação com a esperança de que um dia comemoraremos juntos da mesma forma que fazia em teus aniversários de vida.

sexta-feira, fevereiro 22, 2008

Salada, mistura – o trivial

“E pelo jeito que estou vendo agora lascou”. Saio - na hora do almoço eu não passo. Eu não me passo. E ao passo do passado passo ou passarinho de vez quem sabe me transformo e vôo. Uma música da Zizi Possi no mp3 equivale certinho a um cigarro. Penso: comprarei um livro por luxo sem expectativa de leitura. Catatônica, paro muito tempo sem parar. Passa tanta coisa com lindas roupas de nada com seda e badulaques. A Sapucaí mental: cinqüenta e quatro minutos de desfile. Meu samba não evolui, não termina, não tem cadencia. Continuo. Depois passo na loja de umbanda, compro uns incensos com os santos que respeito. Peço licença pra tudo, até pra respirar. Sinto crescer e murchar: sístole e diástole, sístole e diástole, sístole, sístole diástole – arritmia. Falta cadencia de novo. Entro na lotérica “Gato”. Um moço bonito, um gato branco no balcão de atendente. Queria que fosse gata se já não é. Pago a tal da conta e já nem conto o dinheiro pra não ficar irritada. Sou ser humano mesquinho pô! e meio de mês tô sem grana também. Copacabana Mon Amour – vem Gil gostoso! Decido comprar um acarajé em São Paulo de uma baiana importada. Dendê neguinha, dendê! Dois reais – não tem preço. Rio. De vibe, vibrations e lembranças – memories! E daquelas coisas nas ruas de Londres e eu Caio. Farei uma festa pra ele no seu aniversário de morte este mês. Foi pacto num beco. De sangue. Ele estava doente e nesse dia eu também fiquei. Combinamos de morrer juntos no mesmo dia e segundo. Mas não deu certo. Ele foi antes. Mas o pacto ficou e visitarei o beco no fim deste ano quando juntar o dinheiro do avião. - Baiano burro garanto que nasce morto – ele cantava na Bahia e ria afetado como sempre. Fui pra praça sentar e pegar o soldahoradoalmoço. Me come por dentro. Outro cigarro só faltava não. Passo na banca da Suzinha. Encho o saco e tomo um sorvete. Outro cigarro? Dizem que é ansiedade de alma. Tenho que fazer um mapa de folha vegetal do coração com suas coronárias e pulmonares. Farei um bem bonito. Pintarei de escuro e obstruirei as veias e colocarei o desenho num vidro de formol com o numero do meu cpf. E falar em coração eu vi um morto. Ele lá deitado na mesa com a sua morte. Me espantou a cara de vivo que ele tinha. Eu nunca tinha visto gente assim tão morta. Minha mãe nunca deixou eu ir a enterro, velório. O primeiro que eu vi foi assim desconhecido mesmo. Entrei e deixei a minha subjetividade lá fora do laboratório. Encarei apenas uma vez e com detalhes. O professor passou o coração de um gordo e de um magro numa bandeja de formol e pra mim só faltou a cerveja. E nem eu que não sou chegada tanto ao álcool, depois de tanto formol, coração e sentada naquela mesa fria me deu uma vontade estranha de mesa de bar. Lembrei também de Antony Hopkins e seu canibalismo e lógico a linda Judie Foster de Clarisse. Me intrigou depois a vida. E se eu ficasse em exposição numa banheira de formol para que eles – os vivos - apreciassem o meu corpo, visse o além de mim e minhas entranhas? Eu com certeza ficaria na mente dos mais impressionados e alucinaria seu psiquismo e os assombrariam em suas camas. Morbidez a parte. Poderia eu falar repentinamente sobre o nada, descrevê-lo e até interpretá-lo. Me passa o nada na cabeça digo e relato. Chego – acabou e passou e eu não passo: sou passarinho de novo e desligo o mp3.

quinta-feira, fevereiro 21, 2008

5 de Dezembro

Na véspera da tua era – chego. Sei pouco do teu reino. Ensina-me a olhar para cima que esse teu paraíso fica além mar. Convida-me assim mansa que chego desconfiada, mas cheia de alegria e lisonja. Não sei o que acontecerá porque hoje tu és a dona do meu futuro, minha clara vista. Como se estivesse à margem de algum portal de além mundo onde sou merecedora do teu amor. Esse teu reino que tem me feito convites através das nuvens é mapa novo de água cristalina. No teu sussurro ao vento ouvi e vi que as águas escuras meu casco já não navega mais. Como braço de Iara, canto de Ondina ou Iemanjá soberana me guia na superfície.
Sei que é tudo muito branco e cheio de sol. Sei que é calmo claro. Sei que é azul também. Sei que é forte porque sinto. Sei de ti rainha porque pressinto.

Na margem da tua época aguardo permissão para atracar. Ou agora tu – por ser de Olimpo – aguardo permissão para transcender.

segunda-feira, fevereiro 11, 2008

Balança do Destino

Ela é incapaz de voltar.
Eu sou incapaz de seguir adiante.

quarta-feira, fevereiro 06, 2008

Configuração

Muita crueldade dos astros posicionarem Sol e Vênus num signo de tanto ardor, profundidade e intensidade como escorpião. Ocorre uma fantasia estranha sobre este aspecto dentro de um relacionamento: para haver um incrível desenvolvimento as partes envolvidas precisam estar fundidas um em outro. O que pode acarretar contradições. O amor precisa estar inteiramente dissolvido nos corpos e expressado como se fosse até por telepatia. Bom para nativos de Peixes ou Escorpião. Para as demais esferas isso corresponde a perda de individualidade e liberdade. Quando essa coesão não ocorre, o escorpiano se sente solto e como se não pertencesse a um segredo especial. Esta é a essência: deixá-lo fazer parte de algo secreto e especial. Discrição é a palavra de ordem. Com todo este cuidado, Vênus mostra uma de suas faces mais belas: o auto conhecimento dentro do amor. Para se dissolver, é necessário que haja um desejo de conhecer a si próprio profundamente. E Vênus em escorpião facilita a jornada por ser mestre em coisas ocultas.
A relação que não é definida é o que mais lhe desorienta. Esse derretimento de alma precisa ser sentido com sinceridade. Se o escorpiano captar em alguém algo falso, este simbolismo de Vênus o faz seguir com sentimentalidades retraídas e se torna obsessivo quando não possui inteiramente o objeto de amor desejado. É capaz de se auto manipular a todos os tipos de jogos. Aposta todo o coração. Quando perde clama vingança, o que sempre acaba ocorrendo de uma forma ou de outra e isto lhe dá forças para cortar o mal pela raiz. Os jogos para quem tem esta configuração podem ser arriscados demais manter tanto sentimento assim na contramão, mas possui um poder de regeneração invejável. Já para aqueles que não podem com o seu jogo, para os que desistem no meio da partida, o gosto do veneno de Vênus pode até demorar para correr o sangue, mas quando acontece, o remorso e o arrependimento seguem a vida daqueles que não foram corajosos o suficiente para se auto reconhecerem no espelho de Vênus em escorpião
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sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Depoimento de lente


Minha vida é uma novela contada em décadas. Assinei um contrato temporário com cláusulas não muito justas com o canal que me transmite. Sou a protagonista da história. Eu e os personagens que contraceno são meus únicos telespectadores. As cenas, eu gravo e assisto no aparelho do passado. Tenho anos de acervos. Queimo alguns por diversão, às vezes. Atuo e interpreto no presente. Como atriz, já fiz muitos papéis que não eram meus. Confundo o elenco com alguma coisa entre estrela e lixo. Decoro minhas falas sem pensar que já foram decoradas. Improviso. O responsável por me manter no ar respeita se decido abandonar certas cenas ou se decido contracenar com alguém que a mim é contra. Enrolo. Procrastino antes que entre os comerciais que me fodem a paciência. Xingo. Esses personagens são todos uns malditos. Inclusive eu: roteirista. Escrevo depois narro. Sou anfitriã do anfiteatro. Decoro: o cenário sou eu quem faço. Figurinista? Escolho sempre qual máscara usar. Todas têm a minha cara. Sonoplasta? Minha trilha sonora descarrila. Figurante? Às vezes, me abstenho de mim e sou testemunha do meu testemunho quando coloco as fitas gravadas e me vejo no canto das cenas de crime; das cenas de amor; das cenas de fuga; das cenas. Como diretor faço minha voz mental gritar para dar os comandos. Ela é quem diz como devo me colocar, como fazer meu olhar, como agir, como jogar a fumaça do cigarro no ar, como brigar e calar. Despeço atores. Contrato outros. Sou despedida da novela deles. Me contratam para outras. Meu trabalho não tem segredo – tem altos e baixos e sem mais delongas.
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